A árvore que anda: mito ou estratégia de sobrevivência?
Coluna Papo Verde com Dani Fumachi

No imaginário popular, há uma palmeira que caminha lentamente pela floresta. Suas raízes longas e expostas lembram pernas em movimento. Guias turísticos apontam para ela com entusiasmo e contam que, ao longo dos anos, essa árvore pode se mover até 20 metros em busca de luz. A espécie? Socratea exorrhiza, apelidada de “árvore que anda”. Mas será que isso é mesmo verdade? A ciência investigou — e a resposta surpreende.
Por décadas, a palmeira amazônica intrigou turistas e botânicos com a ideia de que poderia se mover pela floresta. Mas o que os dados científicos dizem, afinal?
A morfologia que alimentou o mito
A Socratea exorrhiza é uma palmeira nativa da Amazônia e de outras florestas tropicais da América Latina. Sua principal característica morfológica são as raízes aéreas em estípite, que se projetam do caule acima do solo, formando uma base cônica.
Essas raízes podem ser confundidas com "pernas", dando a ilusão de movimento. E, de fato, em ambientes onde o solo cede ou se torna sombreado, a planta pode desenvolver novas raízes em outra direção, enquanto as antigas secam. A partir disso, surgiu a hipótese: será que ela se move lentamente ao longo dos anos?
O que diz a pesquisa científica
A teoria ganhou força nos anos 1990, mas carecia de comprovação empírica. Em 2005, o botânico Gerardo Avalos, da Costa Rica, conduziu um estudo detalhado publicado na revista científica Biotropica. A pesquisa avaliou várias Socratea em campo, monitorando crescimento, desenvolvimento radicular e posição do caule ao longo do tempo.
Conclusão do estudo:
“Não há evidência de que a Socratea exorrhiza se desloque no solo. O padrão observado é de substituição de raízes, mas o tronco permanece fixo.”
Ou seja, o que parece um movimento é, na prática, uma estratégia de adaptação para estabilidade estrutural, comum em plantas que crescem em solos instáveis ou sujeitos a alagamentos. A palmeira se adapta, mas não caminha.
Por que isso ainda é relevante
Mesmo sem andar, a Socratea exorrhiza continua sendo uma espécie extremamente adaptada ao ambiente amazônico. Suas raízes aéreas:
- Reduzem o contato com o solo encharcado.
- Aumentam a fixação em terrenos íngremes ou frágeis.
- Permitem regeneração rápida em caso de danos ao caule basal.
Além disso, ela participa do equilíbrio ecológico local, fornecendo abrigo e alimento para insetos, aves e pequenos mamíferos.
A palmeira “que anda” não se move. Mas isso não a torna menos impressionante. Pelo contrário: o fato de a natureza ter desenvolvido um sistema radicular tão funcional mostra a complexidade da adaptação evolutiva das plantas tropicais. A Socratea exorrhiza é um lembrete de que a floresta não precisa de lendas para ser extraordinária — basta observá-la com atenção.